We all know what to do but no one does it

Depois do brinde, ela pegou uma garrafa de Heineken e se debruçou na varanda, observando o mar. Infelizmente, sua presença inesperada foi notada por alguém, assim como sua ausência momentânea. Ele se debruçou ao seu lado, fazendo com que ela se sobressaltasse.
- Não me entenda mal, mas o que está fazendo aqui? - disse ele, com aquele maldito sorriso irônico. Bebeu um gole de sua própria cerveja.
- Não devo explicações, mas Julie é minha amiga, caso você não se lembre, e estou aqui por pura consideração.
Ele continuava com aquele sorriso. Ela sentiu seu rosto esquentar, e uma enorme vontade de sumir. Porque sabia que aquele reencontro era inevitável, e até provável naquela noite. Mas não esperava que além do réveillon fossem comemorar uma proposta de trabalho que surgiu para ele no exterior. E também não queria que ele visse o que os seis anos da faculdade de medicina haviam feito com ela. Seu cabelo estava curto e da cor natural, não tinha mais tempo para cuidar das unhas e já havia desistido de disfarçar as olheiras que as noites de estudo e os plantões haviam lhe dado.
- Vai passar quanto tempo na Califórnia? - perguntou ela, a curiosidade transparecendo no tom da voz.
- "Não devo explicações", mas nem eu sei. No mínimo até concluir o projeto. Uns seis meses. Depois pode ser que eu fique por lá. - Ele acendeu um cigarro e ofereceu a carteira de Marlboro para ela, que aceitou. - Pensei que médicos não fumassem.
- Não deveriam, na verdade. O monóxido de carbono faz ligação permanente com a hemoglobina, o que diminui o espaço para transporte de oxigênio. Por isso, fumantes perdem o fôlego. Além disso... Esquece - disse ela, tragando o cigarro em seguida. Ele riu.
- Você mudou demais.
- Não mudei - retorquiu ela rapidamente, pensando que ele se referia à sua aparência.
- Claro que mudou. Lembra como eu te conheci? Você estava na fila daquele bar, e antes que te pedissem identidade, disse que você estava comigo. - Ele sorriu.
- Acho que já te agradeci por isso - disse ela. Ele meneou a cabeça e eles riram.
- Gostei de você desde o momento em que te vi. Michael achou loucura, porque você era praticamente uma criança.
- Eu tinha dezesseis anos! Quase dezessete. E a Julie não é exatamente da idade do Michael - disse, irritada. Ele riu.
- Eu não me importava com a sua idade. O que nos separou não foi isso. - Seu rosto ficou sério, repentinamente. - Acho que isso foi só uma desculpa pra acabar com tudo. Eu soube que isso ia acontecer já quando você me contou dos seus sonhos.
- Não culpe meus sonhos! O fato de serem o extremo oposto dos seus não me impediu de te apoiar incondicionalmente no começo.
- Ninguém está culpando ninguém. Mas o que você esperava? Eu viajava demais, e nas poucas vezes que nos encontrávamos você precisava estudar. Ah, esquece isso agora. O que você espera desse ano?
Ela ficou aliviada pela mudança de assunto. Deu uma última tragada no cigarro e bebeu o resto da sua cerveja.
- Sobrevivência.
Ele sorriu.
- Eu disse que você tinha mudado. Antes você esperava um milhão de coisas.
- E me decepcionava depois.
- Não espera mais morar na California? Eu lembro que você dizia...
- As coisas mudam.
- Jura? Por que se quisesse passar as férias lá, podia viajar comigo. E talvez ficar por lá mesmo.
- O quê? Está perguntando se eu quero morar com...?
- É. Não vai ter problemas pra arrumar trabalho lá, e...
- Amanhã você vai se arrepender de falar essas coisas.
- Não. Eu também mudei.
- Prove - disse ela, rispidamente.
- Engoli meu orgulho pra falar com você agora. Acho que nós dois estamos conseguindo o que queríamos, mas sempre achei que viveríamos isso juntos.
- Eu também. Mas eu não quero voltar atrás, agir feito uma idiota e viajar com você, e um mês depois voltar pra cá e recomeçar outra vez. E não ter argumentos para todo mundo que repetir os mil motivos que temos para dar errado.
- Me abrace - pediu ele.
Ela hesitou por um momento, suspirou contrariada e o abraçou. Isso foi suficiente para todos as lembranças voltarem com força à sua mente. Queria se entregar, deixar seu corpo ceder, e se concentrar apenas em sentir o perfume dele.
- Sinto falta disso - disse ele com a voz rouca, acariciando seu cabelo. - Por que não paramos de complicar as coisas? Nós dois queremos isso, e nós dois sabemos. Não diga que não.
Eles se afastaram e ele acrescentou:
- Não posso garantir que vai dar certo, ou que vai durar pra sempre. Tudo o que posso fazer é me esforçar pra que seja bom.
Ele beijou seus lábios delicadamente.
- Definitivamente, você não é o primeiro que diz que eu mudei. E nos seus braços eu ainda me sinto com dezesseis anos de idade. Naquela época eu achava que você era a melhor coisa que tinha acontecido na minha vida. Por medo de te perder, não tinha coragem de dizer "não". E agora com oito anos a mais, me sinto assim outra vez. Talvez eu não tenha mudado tanto.
- Isso significa que você vai comigo? - Ele sorriu, afastando seus cabelos e segurando seu rosto, dando pequenos beijos perto de seus lábios.
- Não. Significa mais que isso.
Eles se beijaram. A única coisa que sabiam do futuro é que não queriam estar separados nele.

Comentários

  1. Olá, parabéns pelo texto!
    Estou seguindo o seu blog super fofo e gostaria que vc seguice o meu por favor.

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    Beeeijos!
    Obga e sucesso!

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