Vícios

Cigarros, meus queridos rolinhos de câncer. Um vício comum e arriscado. Pleno século XXI e ainda há quem veja glamour nessa porcaria. Estou incluída nesse grupo de boçais. Tenho plena consciência de que ao tragar levo 5000 substâncias tóxicas ao pulmão. Sei que o monóxido de carbono gruda na hemoglobina como chiclete no cabelo, e a consequência disso sou eu ofegante em meio lance de escadas. O pior de tudo é que tive exemplos em casa, mas alguns erros são cometidos de novo e de novo, e alguns de nós nunca aprendem. Sim, meus pais tiveram a infelicidade de viver seus 15 anos numa época em que o cigarro pós-coito parecia a melhor experiência que alguém poderia ter. Até hoje pagam o preço.
Por que alguém se lançaria nessa dependência a ponto de almoçar sanduíche apenas para ter 6 reais a mais e sustentar o vício? Meus caros, a resposta é simples. Porque temos um neurotransmissor responsável pelas sensações de prazer e bem-estar, a acetilcolina, e parece que vem falhando miseravelmente pra mim. A nicotina toma o lugar da acetilcolina, e é assim que me sinto leve, ligeiramente tonta e sempre querendo mais. Troco dinheiro e saúde apenas por momentos de prazer. A vida me ensinou que nada dura pra sempre, e ser feliz hoje é mais importante que ser feliz pra sempre. Pouco me importa se existem caras (lindos) que abominam o fumo dizendo que beijar um fumante é como lamber um cinzeiro.
Esse é apenas o primeiro vício, e não é o pior. Sou uma vítima da minha própria mente. Sou viciada em imaginar coisas que nunca vão acontecer. Meu corpo está ali, minha boca está fechada, eu apenas observo com os olhos distantes. Não demora muito até que alguém me diga que estou quieta demais. Qual! Se soubessem o barulho que acontece na minha cabeça... Estarei completamente ferrada quando hominídeos sofrerem alguma mutação e se tornarem capazes de ler mentes.
O corpo na aula de história, a mente em uma cama macia com o professor em cima de mim. O corpo num show qualquer, a mente em cima do palco com uma Gibson SG nova. O rosto inexpressivo diante de uma ofensa, a mente socando o indivíduo até ele mijar nas calças e chamar pela mãe. O corpo no banco do carona, a mente no volante de um Camaro com AC/DC no último volume. Imaginar pode ser deveras interessante, mas sempre faz com que eu me pergunte o que tudo devo ter perdido enquanto minha mente estava há anos-luz dali.
Existem também os pequenos vícios, como livros, café, compras, elogios, seriados, sono, escrita, unhas roídas, melancolia, et coetera. São como lobo em pele de cordeiro, e de inofensivos não têm nada. Basta você ser viciado em compras e ficar sem dinheiro para perceber como pode ser cruel. Ou um viciado em escrita com um sério bloqueio. Ou ainda uma criança roedora de unhas quando a mãe coloca pimenta nas pontas dos dedos.
Também sou viciada em um certo alguém, mas isso já é mote para narrativas mais longas. Sei explicar todos os meus vícios e conheço suas consequências, acreditando estar pronta para arcar com elas. Mas se me perguntassem por quê gosto tanto dele, daria um meio sorriso torto e diria que ele tem um je ne sais quoi que me enlouquece. Alguns vícios são muito irracionais.

Comentários

  1. Esse é apenas o primeiro vício, e não é o pior. Sou uma vítima da minha própria mente. Sou viciada em imaginar coisas que nunca vão acontecer. Meu corpo está ali, minha boca está fechada, eu apenas observo com os olhos distantes. Não demora muito até que alguém me diga que estou quieta demais. Qual! Se soubessem o barulho que acontece na minha cabeça... Estarei completamente ferrada quando hominídeos sofrerem alguma mutação e se tornarem capazes de ler mentes.

    AMEI esse trecho! *-*

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