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Mostrando postagens de 2013

Amoródio

Parece haver uma distância enorme entre amor e ódio. Dois opostos, preto e branco, 8 ou 80, excludentes, distantes um do outro como Mercúrio de Plutão. Não. A linha é tênue. Freud explica que quando bebês começamos a distinguir os limites entre o que somos nós e o restante do universo, e talvez disso resulte o sentimento de ligação que identificamos nas religiões, e blablablá whiskas sache. Talvez por esse sentimento eu...: - Me odeie, e consequentemente odeie quem me ama. Porque não temos nada em comum. - Ame quem me odeia, e isso nem sei explicar, mas tenho quase certeza que Freud consegue. - Não me interesse por quem não me ama nem me odeia, não fede, nem cheira. Nem foder, nem fazer amor. Muito simples, muito seguro, mas sem riscos não há emoção. Não perca seu tempo. - Odeie quem ama demais a si mesmo, porque somos todos feitos da mesma porra de matéria orgânica estúpida. Você pode pensar que é único entre 7 bilhões. Eu acho que você é só mais um entre 7 bilhões. Você só me ama qua...

Outubro, novembro, dezembro e julho.

Outubro: o timing perfeito, mais uma vez. Cobri os seios, você ofereceu seu braço para que eu pudesse deitar, e nesse meio abraço dividimos um cigarro. Estava tudo maravilhoso, até você dizer "eu te amo". E ficar sem resposta, obviamente. Não queria dizer "obrigada", para não te magoar, pois mesmo não te amando, te respeitava. Meu coração ainda estava acelerado, e minha respiração ofegante, comecei a suar frio e permaneci calada. Por que você precisava fazer um grande caso disso? Detestava todo e qualquer tipo de cobrança, então por que cobrar essa reciprocidade? Você surtou. Perguntou o que mais precisava fazer para ouvir um "também te amo". Ri por dentro, pensando em te dizer para apertar um daqueles ursos de pelúcia que você tinha me dado, e poderia ouvir declarações quando quisesse. Mas percebi que dessa vez era diferente. Você realmente estava com raiva. E cansado, combalido, fadigado, extenuado, exausto da minha secura. Foi quando te perdi. Novembro:...

Love it, live it, leave it

Como sempre, não era por causa do objeto em si, mas por tudo o que ele representava. Era apenas uma edição de Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban. Não estava surrada, nem rasurada - ela sempre cuidara bem dos próprios livros. As páginas haviam se tornado ligeiramente mais amareladas, e o detalhe metálico no título da capa estava riscado; coisas que aconteceram pelo uso, não por descuido. Ela tinha apenas 8 anos quando o ganhou. 10 anos depois, ainda se lembrava como se fosse ontem. Sua mãe nunca havia lhe comprado livros. Não por maldade, mas porque diante das dificuldades financeiras, livros não eram prioridade. Mas seu pai sempre se esforçava para lhe dar algo. Quando ainda era pequena, às vezes seu pai chegava do trabalho e lhe dava uma revistinha de colorir, ou uma revista em quadrinhos. Ela pulava em seu colo e o beijava para agradecer, e seu sorriso de poucos dentes de leite valiam o dinheiro gasto. Ler se tornou um hábito. Toda semana, ela pegava um livrinho na biblioteca. U...

O leão por dentro

Decepções ainda não eram parte de seu mundo. Estava muito bem (mal) acostumado a ter tudo o que queria, como queria, na hora que queria. Tudo sempre dava certo, porque o acaso estava ao seu lado. Essa ideia de realmente se importar com outra pessoa era completamente nova. É por isso que levou um tempo para assimilar o fato de que havia uma coisa no mundo - a única que ele queria de verdade - que ele não podia ter. Foi um tempo difícil feito de horas intermináveis de introspecção olhando para o céu ou para o mar, incontáveis cigarros em noites insones cada vez mais frequentes, algumas muitas doses de álcool e loucura. "Você merece coisa melhor". "Você é muito novo pra sofrer por causa disso". Muitas verdades lhe foram ditas, e respondidas com a devida grosseria. É que as pessoas que dizem isso não entendem que nem todo mundo está pronto pra todo tipo de verdade. Algumas devem ser descobertas por conta própria, sozinhas. As chances de novas experiências vieram nesse t...

Estranhezas

Para o inferno com o lirismo feito para arrancar suspiros daqueles que ainda conservam a inocência. Sincera e categoricamente afirmo que o que escrevemos agora não é uma história de amor, pois só se ama uma vez, e meu querido, eu já amei outro alguém. Agora meu coração é o mais novo endereço do senhor Vazio, e ele nunca dorme. A inocência se perde quando alguém te espreme até o bagaço, e depois te diz que não há suco algum. Entende agora por que só se ama uma vez? Eu sei que você entende, e fico feliz que não me ame também. Mas não sou má, sou pequena. Tão pequena que só há espaço para um sentimento por vez. Peço que não perca a paciência, sentir é lento. Apenas me abrace forte, me permita o silêncio, e me dê um beijo de boa noite. Mas não me obrigue a dizer que a única coisa que gosto em nós dois são as nossas estranhezas...

Crise de fé

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Papai teve uma crise de fé uma vez. Passou a se chamar de "escritor não-praticante". Seus dois primeiros livros publicados foram bons, mas o terceiro foi particularmente excelente. Mudar para a Califórnia estragou tudo, e nós sabemos disso. Seus lábios envolveram a grande ereção de Hollywood e chuparam com força. Foi assim que seu livro genial, chamado "Deus nos odeia" acabou virando uma comédia romântica estúpida. E foi assim que nossas vidas começaram a desandar. Não é culpa de Los Angeles. E por mais que não seja culpa de minha mãe, meu pai perdeu sua musa. O trabalho de meu pai era simplesmente escrever, e ele dizia que escrever era como ter lição de casa todos os dias pelo resto da sua vida. Como eu me sentia quando lia seus trabalhos? Era difícil aceitar que tudo era verdade. As drogas, as garotas e o sexo, a raiva e a dor que ele sentia... Era um pouco invasivo, e meio desolador. Mas tudo foi muito pior na crise de fé. Se ele não escrevia nada, era porque não...

Essa sociedade

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Uma família tem um casal de filhos. Aparentemente, tanto menina como menino recebem a mesma educação; estudam na mesma escola, ganham o mesmo valor de mesada, recebem presentes de mesmos valores. Mas apenas a menina é incentivada a ajudar a mãe na limpeza e na cozinha, porque "ela deve ser prendada, para um dia fazer tais coisas para o marido". O garoto começa a namorar, e é encorajado pelo pai, orgulhoso de ter criado "um garanhão". Mas quando descobre que a filha também tem um relacionamento, logo começa com sermões e conversas sobre como se comportar. Ele passava horas no banheiro, e sua mãe ria e chamava isso de "fase dos banhos longos", que sua irmã, graças a Deus, jamais teve, porque menina não faz isso; não merece o prazer que o seu corpo pode lhe dar. Quando nova, a menina chorava ao ter o joelho ralado na brincadeira de rua; logo era consolada pelos pais, mas que a lembravam logo que esse tipo de brincadeira não era adequada para meninas. Quando o...

Drink up, sweet decadence

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O que eu ganho com isso? É o que eu venho me perguntando a cada ressaca e até hoje não encontrei resposta. Acordei no sofá-cama desconfortável da sala. Podia dizer que cheguei em casa tão mal que apenas me joguei no sofá e dormi, mas a verdade é que já faz algum tempo que não durmo no quarto. Por quê? Porque a lâmpada queimou há treze dias, e ainda não tive a decência de comprar outra e trocar. E é difícil pra mim confessar que estou esperando reunir coragem (ou perder totalmente a vergonha que me resta, como queira) para encarnar a donzela em perigo e pedir ao meu belo vizinho que faça uma gentileza. Meu corpo todo doía. Ainda estava de vestido. Ao meu lado estava a necessaire capotada com as maquiagens que havia usado ontem. Só não estava com dor de cabeça porque ainda estava entorpecida com as bebidas de ontem. Ontem tinha sido diferente. Ontem, pela primeira vez na vida, dormi com um estranho. Eu não estava me sentindo um lixo por causa disso. Eu não era exatamente uma moralista. C...